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Literatura Colonial Portuguesa

Literatura Colonial Portuguesa

24.03.10

Julião Quintinha - África Misteriosa


blogdaruanove

Capa de Bernardo Marques (1899-1962).

 

Julião Quintinha (1885-1968), Africa Misteriosa (1928).

 

Com este livro Julião Quintinha recebeu um dos galardões, o terceiro, do Prémio de Literatura Colonial de 1928 da Agência Geral das Colónias, situação que se viria a repetir nas duas edições subsequentes - em 1929 com o segundo volume deste obra, Oiro Africano, que recebeu o segundo prémio, e em 1930, onde já recebeu o primeiro prémio, com A Derrocada do Império Vátua, volume escrito em co-autoria com Francisco Toscano (1873-1943).

 

 

Inserindo-se num género de crónica jornalística que combina impressões de viagem com comentários de carácter histórico e sócio-político, este volume relata a viagem efectuada pelo autor entre Lisboa e Lourenço Marques, com descrições e apreciações detalhadas sobre cada uma das então colónias portuguesas, reservando para Oiro Africano uma descrição mais alongada sobre Moçambique e a África Oriental.

 

Do capítulo que o autor dedicou à Ilha do Príncipe transcreve-se uma passagem:

 

"Eis-me no Principe, ilha encantadora rodeada de grutas e rochedos onde moram negros pescadores de tartarugas, à sombra dos coqueiros; perfumado jardim do Equador, estonteante dos arômas de baunilha, rosa, flôr de café e das orquídeas bravas; praias atapetadas de relvedos que cheirama a lúcia-lima, onde crescem as figueiras bravas, a fruta-pão, o safú, e o Sol dos tropicos doira as amendoas de cacau.

 

A baía parece um lago para brinquedo; do navio tocam-se as árvores com a mão. E ao fundo, estampada no scenário dos três picos, a cidadesinha ajardinada...

 

Desde o Pico do Papagaio até às praias de Nordéste estremece a floresta em verdes metálicos, scintilantes. Para Oéste, os picos aguçados, agulhas e piramides de granito engrinaldadas de trepadeiras onde se despenham cachoeiras, e vai todas as tardes afogar-se o sol.

 

Teorias estranhas de nuvens, muito brancas, envolvem os môrros em caprichosas visões: O pico dum monte, ao sul, parece o bico dum seio rompendo túnica de rendas alvas; rôlos de nuvens, como rebanhos de búfalos, descem vagarosamente aos rios, a pastar; outras vezes são cavalgadas, fantásticos cortejos impelidos pelo vento, que se dispersam na floresta, deixando rastros de veus, farrapos de mantos, flocos de arminho...

 

Em baixo, no porto, vive tranqúila a pequena cidade comercial, "gare" marítima das roças, aguardando que o Príncipe venha a ser imperador do Golfo, com grandes palácios erguidos nêstes jardins do Trópico.

 

Espelhando-se nas águas da baía, entre o silêncio dos jardins, o palacio comercial de Jerónimo Carneiro, que faz lembrar, pelas preciosidades que encerra, a vivenda dum veneziano de bom gôsto, fidalgo, artista, e mercador."

 

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