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Literatura Colonial Portuguesa

Literatura Colonial Portuguesa

15.06.13

Cochat Osório - O Homem do Chapéu


blogdaruanove

 

Cochat Osório (1917-2002), O Homem do Chapéu (1962).

 

Ernesto Cochat Osório nasceu em Luanda e faleceu em Faro. Tendo-se formado em Medicina, na cidade de Lisboa, regressou depois a Angola, onde exerceu como médico.

 

Consagrado essencialmente pela sua poesia, género em que foi autor dos livros Calema (1956), Cidade (1960), e Biografia da Noite: Poemas (1966), Cochat Osório foi também prosador, tendo publicado o conjunto de contos intitulado Capim Verde (1957) e o presente volume, que integra dois contos – O Homem do Chapéu e Espelhos. 

 

O primeiro narra, de forma algo tragicómica, a experiência fracassada de um colono que abandonara a sua aldeia procurando fortuna em África, a qual é miseravelmente simbolizada pelo chapéu novo que adquire, e aí acaba por sucumbir após contrair uma febre tropical.

 

O segundo relata o renascer da esperança num homem de cinquenta e cinco anos, que havia sido despedido, que recorre a expedientes ridículos para disfarçar a idade mas a quem vem a ser confiado um cargo de administração numa roça.

 

Do conto Espelhos transcrevem-se os últimos parágrafos:

 

"Já se esfumavam as caras e as expressões. O barco movia-se lentamente. A mulher e os filhos , os soluços e os abraços, os pedidos e os conselhos. "Paizinho, volte depressa!" "Pai, leve-me consigo!" "Paizinho!..." Rosamond e o menino. E o abraço do Sr. Pires. E a Nocas também (porque o pai lhe pediu para conhecer Rosamond). E o sr. Correia que se apaixonou pela história do cabelo  pintado. E a Blá... Não. A Blá já não saía. E o capacete colonial, uma espécie de emblema de primeira viagem. E os comprimidos contra o enjoo. Tudo agora eram manchas claras, imprecisas, que o sol poente batia de lado. E que as lágrimas esfumavam.


Um sacudir ritmado de máquinas potentes. Lenços e lágrimas. Lenços. Pontos brancos. Adeus.


Roque voltou-se. Acendeu um cigarro e o fósforo tremia na mão nervosa. Andou vagarosamente, vagarosamente, para o camarote. Mas o passo cresceu, um ritmo obcecante de marcha impôs-se, como se a orquestra que moía os ouvidos mandasse naqueles passos. E Roque viu-se de repente a subir uma escada. Um passo elástico e jovem, para fugir do medo. Os dentes cerrados, respiração forçada, para secar os olhos. E de repente, no patamar, um espelho. Roque olhou espantado. Olhou de novo. Os olhos nem acreditavam mas teve coragem para sorrir. Um sorriso franco e largo.


No espelho sorria um homem: O Sr. ROQUE, gerente comercial da roça BOA NOVA." 

 

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