27.02.14
Revista Atlântico (I)
blogdaruanove
Capa do número 4, Nova Série, de 1947.
Mantendo a tradição iniciada a partir do seu primeiro número, que havia sido lançado em 1941 e divulgara, sob o título O Sr. Euclides Varanda, um excerto de Chiquinho, romance de Baltasar Lopes (1907-1989) que haveria de vir a ser publicado em 1947, este número 4 da nova série da revista apresenta colaboração de mais um autor africano.
Sob o título Poemas Caboverdianos, publicam-se aqui dois poemas de Manuel Lopes (1907-2005) – Pescadores de Santo Antão, dedicado ao compatriota e "claridoso" companheiro Manuel Velosa (1901-1956), e Terra, dedicado ao escritor e diplomata brasileiro Ribeiro Couto (1898-1963; cf. http://blogdaruaonze.blogs.sapo.pt/200643.html).
Colaborador do movimento literário Claridade desde a primeira hora, mas consagrado essencialmente como prosador, Manuel Lopes (http://literaturacolonialportuguesa.blogs.sapo.pt/tag/manuel+lopes) apresenta-nos aqui dois poemas que antecedem temáticas posteriormente desenvolvidas nos seus contos e romances.
Essas temáticas aproximam-se dos princípios que estiveram na base daquilo que, na literatura portuguesa, se denominou como movimento neo-realista.
Transcreve-se de seguida, integralmente, o poema Terra:
"Endireitou o busto suado.
O sol traçou a sua sombra esguia
na terra remexida.
Pensou no mar enorme,
nas velas perdidas sobre a vasta monotonia
do mar enorme,
nos temporais e nos naufrágios,
nas vidas perdidas dos marinheiros,
nas lutas inúteis,
na escuridão sem fé do homem nos portos estrangeiros.
Limpou da fronte o suor,
no gesto simbólico de quem faz o sinal da cruz.
– O suor que cai na terra maternal,
leva o milagre fecundante do amor –.
Olhou ao redor,
viu as montanhas altas e tranquilas,
o céu azul,
– sobre o vale pairava um vasto silêncio.
E sentiu-se protegido e abençoado,
seguro e livre na sua doce escravidão antiga.
– O sol desenhou uma sombra no dorso nu, curvado,
e uma enxada cavando, cavando na mãe-terra amiga..."
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