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Literatura Colonial Portuguesa

Literatura Colonial Portuguesa

12.09.23

Revista Cultura (I)


blogdaruanove

 

Esta revista, cuja publicação se iniciou em 1956, tinha como subtítulo Revista Portuguesa de Educação Popular, parecendo querer evocar, de modo inevitavelmente restrito, o princípio da generalização da cultura para a educação das massas, numa tradição já anteriormente promovida pela revista Seara Nova (fundada em 1921) e entretanto seguida, também, por algumas editoras como a Cosmos (a famosa Biblioteca Cosmos foi lançada em 1941) ou a Inquérito (fundada em 1938). 

 

Tal como se verifica nesta capa, cada número apresentava uma elevada e heterogénea quantidade de textos, os quais, estando limitados às quarenta páginas da revista, têm como inevitável consequência uma concisão dos artigos, que tendem a ser demasiado generalistas e cujos conteúdos roçam, por vezes, a superficialidade.

 

Dirigida por João Alberto Frazão de Faria (datas desconhecidas), a revista tinha no seu quadro colaboradores provenientes de diferentes áreas profissionais, como o economista Afonso Howell (datas desconhecidas), o médico A. M. Estanco Louro (datas desconhecidas), o advogado e escritor Geraldo Bessa Victor (1917-1985), o engenheiro Ilídio Alves de Araújo (1925-2015), o pintor José Júlio Andrade dos Santos (1916-1963), o filólogo José Pedro Machado (1914-2005) ou o escultor Martins Correia (1910-1999).

 

Neste número anunciam-se poetas de Cabo Verde, que são Aguinaldo Brito Fonseca (1922-2014), com o poema Noite, e Nuno Miranda (1924-2022), com o poema Recado, mas surge também outro autor cabo-verdiano, Gabriel Mariano (José Gabriel Lopes da Silva, 1928-2002), com o conto Resignação.

 

Transcreve-se hoje o poema Recado, de Nuno Miranda, colaborador de segunda geração da revista Claridade, que até àquela data ainda não lançara qualquer livro mas haveria de vir a publicar os volumes Cais de Ver Partir (1960), Cancioneiro da Ilha (1964) e 40 Poemas Escolhidos (1974), no âmbito da poesia, e Gente da Ilha (1961), Caminho Longe (1974) e Cais de Pedra (1989), na ficção.

 

Poema marcado pela "sôdade", mais do que pela dureza da vivência e sobrevivência no quotidiano do arquipélago, traduz o sentimento do desterrado ansiando por um intangível locus amoenus, que tanto é o seu passado como a memória da sua vida enquanto ilhéu, num lirismo quase onírico que é também marca identitária do movimento claridoso.

 

RECADO

 

Quando aportares

dá-lhes notícias de mim nesta cidade.

 

Diz-lhe [sic] da voz surda estremecendo

e leve e tonta no meu peito, como se nada fora

ao vento que se escapa a este céu onde viceja um cravo,

a flor do meu destino.

 

Diz-lhe [sic] que vou-me às vezes da noite roxa

pelos subúrbios de tons de calmaria

na ronda de lembranças já mortiças

mas, velhas cicatrizes não saradas,

ai de mim!...

 

Não encontro

as ruinhas serpeando pela minha intimidade

o limo nos beirais das ruas do porto

o sonho de mar alto em cada olhar ficado

não vejo

a casa velha do terreiro alto onde ancoravam

os nocturnos das viagens de arrabalde.

 

Que é dos traquetes tombados e dos botes carcomidos?...

 

Só a lembrança de outrora

na flor deste destino.

 

Se te falarem de mim quando aportares

diz-lhes que vai ao longe na cidade a estibordo

a nave desta carne macerada

 e a asa de minha alma, ao céu aberta...

 

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