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Literatura Colonial Portuguesa

Literatura Colonial Portuguesa

02.03.25

Revista Cultura (VI)


blogdaruanove

 

 

 

O número 21 desta revista apresenta o poema Pressentimentos, de Maria Madalena, que havia sido já publicado na revista Cabo Verde.

 

Este pseudónimo, de minimalista inspiração bíblica, corresponderá a Maria Madalena Valdez Trigueiros de Martel Patrício (1884-1947), a primeira escritora portuguesa nomeada, por Bento Carqueja (1860-1935), para o Nobel da Literatura, nomeação que ocorreu em 1934 e se repetiu em anos subsequentes.

 

Curiosamente, a escritora ter-se-á estreado com a publicação de uma obra em língua francesa, Le Livre du Passé Mort (1915), a que se seguiram Impressões de Arte e de Tristeza (1915), Sombras na Estrada (1920), Poemas da Côr e do Silêncio (1922), Os Sete Demónios (1926), Sagradas Pedras (1930) e Rosário da Vida (1935), entre vários outros títulos.

 

Embora não se conheça qualquer registo que associe a autora a África ou a Cabo Verde, e justifique a sua publicação na citada revista, transcreve-se o referido poema, considerando eventuais referências, ambíguas e equívocas, à insularidade e os valores metafóricos que estas podem traduzir:

 

"Terei de aqui ficar a vida toda

À espera de partir?...

Olhando o mar,

Esperando o navio que há-de chegar.

A carta que há-vir?

Terei de aqui ficar ouvindo

O lento caminhar das horas?

Ouvi-las soluçar

A minha vida inútil e vazia

E bater devagar,

Os silêncios e espantos que ela cria?

Terei de aqui ficar a vida toda

Ouvindo as horas lentas repetir

O oco, da minha pobre vida

Falhada?

Terei de aqui ficar à espera da chegada

Daquele barco que nunca há-de chegar

E que há-de encaminhar

A minha vida a rumos ideais?

Terei de esperar essa carta

Que não chegará mais?

Terei de esperar que se abra essa porta

Que teima em não se abrir?

Já sinto no meu sangue

As horas lentas caminhar,

O mar rugir,

A carta que não tarda,

A hora que se apressa,

A vida que começa,

E o barco, que enfim! se fez ao mar!...

E hei-de partir!

E hei-de viver!

E hei-de aqui ficar a vida toda

à espera de morrer..."

 

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